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“Mário Passos continua a ser intransigente connosco e não aceita reunir”

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Em entrevista ao Jornal do Ave, Diogo Barros, fundador do movimento Humanamente, revelou a estreia de uma marcha LGBTQIAP+ para a Póvoa de Varzim. É a quinta cidade a receber a iniciativa, depois de Vizela, Famalicão, Santo Tirso e Guimarães. Diogo Barros manifestou ainda “medo” com o cenário de eleições a dar vitória aos partidos da direita e criticou Mário Passos, presidente da Câmara de Vila Nova de Famalicão, a quem acusa de intransigência e falta de cooperação. A assumir novo mandato, o foco está na estabilidade financeira e no crescimento, reforçando a importância do diálogo para reforçar a luta pelos Direitos Humanos.

Jornal do Ave (JA): Como é que nasceu a sua ligação com o movimento Humanamente?
Diogo Barros (DB):
Um pouco antes de 2021, já andava a pensar em formas de trazer um ativismo de Direitos Humanos e LGBT para esta zona do Vale do Ave. Em conversa com outros camaradas de outras forças políticas e outros ativistas, pensamos trazer as marchas a Famalicão e Guimarães. Decidimos, em agosto de 2021, criar o GAPQ (Grupo de Apoio a Pessoas Queer). Entretanto, num grupo de quatro pessoas em que eu fui fundador passamos para dez, depois para 30 e então sentimos a necessidade de alargar o espectro desta luta e, em vez de ser só LGBT, passou para Direitos Humanos. Foi aí que houve essa reestruturação e passou a ser a Humanamente. Houve essa mudança de nome e um bocadinho desse espectro não nos fez demover do foco da luta LGBT e a nossa raiz, que tem matriz no Vale do Ave. Estamos agora a alargar para a Póvoa de Varzim, no dia 10 de março.

JA: Qual é o objetivo deste movimento e como tem sido o feedback da população no geral?
DB:
Vai sempre depender de concelho para concelho. Por exemplo, em Famalicão de onde sou residente e natural, nem sempre é fácil. Acaba por ser um concelho que está muito ligado ao conservadorismo, tal como Braga, por ser um concelho superreligioso e ultraconservador, então não tem tanta abertura e também parte um bocadinho da própria Câmara Municipal, que não tem, de todo, nenhum tipo de abertura, o que também é um bocadinho esperado, tendo em conta a cor partidária que governa.
Em Santo Tirso, tivemos muito boa receção, tivemos uma reunião com a Câmara e houve abertura para diálogo, tal como Vizela, onde, inclusive, a Câmara ajuda-nos no processo de organização da marcha e desde que criamos a Humanamente. Por parte da população em geral, há sempre nas marchas LGBT um ou outro bitaite, ou provocação, mas de forma geral tem corrido bem, não temos tido nenhum tipo de constrangimento de violência, nem nada disso, inclusive a única mancha neste currículo acaba por ser, às vezes, o tom ameaçador que recebemos por parte da Câmara de Famalicão, ou das forças de segurança, que nem sempre querem cooperar muito nesse aspeto e não fazemos marcha nenhuma sem a cooperação das forças de segurança.

JA: A Humanamente é um movimento social pela defesa dos Direitos Humanos e promotor das marchas LGBTQIAP+. Pretendem aumentar as marchas para outras cidades?
DB:
As marchas neste momento são em Vila Nova de Famalicão, Santo Tirso, Vizela, Guimarães e vamos agora estrear Póvoa de Varzim. Estamos a fazer um estudo para ver se é viável, ou não, Vila Nova de Gaia. Nós não fazemos marcha nenhuma sem termos membros da Humanamente lá, porque não faz sentido estarmos a ir a um concelho só porque sim, só para fazer número.

JA: Considera que apenas através das marchas existe uma contribuição para que a luta ativista seja suficientemente visível na sociedade?
DB:
É preciso diálogo, cooperação, trabalho no dia a dia, reuniões com câmaras e com associações atividades que vão surgindo ao longo do ano, para ter visibilidade e para combater as falhas. Por exemplo, em Vizela, a Humanamente participa ativamente na elaboração do plano para a igualdade e discriminação. Há esse tipo de trabalho que é preciso ser feito ao longo do ano, a marcha acaba por ser um grito de revolta e uma forma de homenagem e foi assim que nasceu a ideia de ter uma marcha LGBT. As marchas nasceram assim ao redor do mundo, para celebrar o orgulho, mas também são de cariz político e social, porque, apesar de alguns avanços feitos em Portugal, é necessário continuar e é preciso fazer mais.

JA: Quem pode juntar-se a este movimento e como?
DB:
A Humanamente está aberta a qualquer pessoa, basta preencher um formulário nas nossas redes sociais ou entrar em contacto com pessoas do movimento. A Humanamente é aberta e trabalha com quem quiser. Se quiser acrescentar às marchas e às nossas lutas, porque também abordamos outros temas, sem ser a questão LGBT, e temos de continuar e aumentar a nossa luta diária, porém, para isso, precisamos de mais pessoas e mais força.

JA: Com o resultado tão satisfatório das novas eleições, vencida com 90,48%, o que pretende acrescentar ou fazer diferente neste novo mandato?
DB:
Acima de tudo, queremos trazer uma estabilidade financeira à Humanamente, porque, por ser um movimento, ainda não tem formalidade legal, nós temos os estatutos sim, como é evidente, mas acaba por faltar esse reconhecimento de base associativa. Também é o primeiro mandato de dois anos, porque até agora eram mandatos anuais, e assim temos mais tempo e mais foco para as nossas lutas e para os nossos objetivos, por exemplo, a estabilidade financeira o crescimento dentro da Humanamente de conseguir abordar outras lutas, fazer com que o tema esteja mais presente nos concelhos em que estamos implementados e trazer mais conquistas porque, por exemplo, se calhar, seria impensável para muita gente ver Vizela com a bandeira LGBT, anualmente, e hoje em dia, isso é uma realidade. Guimarães e Famalicão não aceitam fazer isso, mas continuaremos na luta e no diálogo para conseguir.

JA: Como descreve a situação atual dos direitos LGBTQIAP+ em Portugal e como vê a possibilidade de um novo programa político poder influenciar na aceitação das diferenças por parte da sociedade?
DB:
Há avanços que já foram feitos ao longo dos anos pela comunidade LGBT, porém há sempre algo mais a fazer e nós olhamos agora para o panorama político e nacional com as eleições a 10 de março com algum medo. Temos o crescimento enorme, a nível das sondagens, do Chega, que acaba por representar a extrema-direita em Portugal e que querendo ou não, tem o seu programa de ataque às minorias, incluindo a comunidade LGBT e isso acaba por nos assustar. Assim como a instabilidade dessa Aliança Democrática (PSD/CDS-PP/PPM) que nunca foi aberta às comunidades LGBT, apesar de agora meterem um bocadinho de maquilhagem para tapar a sua homofobia e transfobia que foi existindo. Não nos esquecemos que foi o PSD e o CDS que, no Parlamento, tiveram voz contra a adoção entre pessoas do mesmo sexo, pequenas conquistas que fomos tendo ao longo do ano sempre tiveram o voto contra da direita e a direita chegar ao Governo acaba para nos assustar, enquanto ativistas. Porém, há uma garantia, como eu tenho dito ao longo dos anos face a Famalicão, que é não será com o medo e com o ódio que nos irão assustar ou abalar ou fazer desistir da nossa luta. Um problema ou algo que nos quer limitar só nos dá mais força para lutar.

JA: Referiu a possibilidade de confrontos com a direita e a extrema-direita. Como planeia lidar com possíveis conflitos e resistir a pressões externas?
DB:
Nós sabemos quais são os partidos que nos defendem e é graças ao PS, ao PAN, ao Bloco, ao PCP e até mesmo ao Livre, que os direitos da comunidade LGBT vão sendo adquiridos. Nós sabemos que a direita tem um projeto político completamente oposto àquilo que defendemos a nível social, no sentido que quer restringir direitos, mas estamos numa democracia e o que nós vamos sempre tentar fazer é dialogar e tentar levar avante as nossas ideias, projetos e os nossos direitos, à base do diálogo e da comunicação e acredito que a força da rua diz muito e força muita coisa a acontecer, a nível de projetos políticos e governamentais.

JA: Afirmou que Mário Passos, presidente da Câmara de Vila Nova de Famalicão, tem dificuldades em aceitar a luta ativista do movimento. Quais são as razões que sustentam esta afirmação?
DB:
Continua a ser intransigente connosco, não aceita reunir connosco, não aceita abertura, contactamos e não temos resposta, nunca obtemos resposta por parte da Câmara sobre a PSP (coordenar a marcha). Tem de ser quase à última, sob ameaça de avançar com uma queixa-crime. Nós não estamos a pedir à Câmara para sairmos à rua, porque é um direito da nossa associação e a marcha LGBT é um direito à manifestação. Recordo-me bem que, na nossa primeira marcha, só na manhã daquele dia é que soubemos que íamos ter a PSP e acho que é uma responsabilidade política, moral e cívica por parte de Mário Passos fazer isso, sendo que, ao longo do tempo em que saía na comunicação social que íamos fazer a marcha, havia comentários com ameaças de morte. Como é que ele, tendo acesso àquilo que se diz e se escreve e que vê que pode estar ali um público sem segurança pública, não nos dá confirmação se vai haver ou não PSP presente na marcha? Nós sabemos que é à base do diálogo que se encontram soluções, porque nós não estamos aqui para dizer que queremos esta data e ponto final e nós é que mandamos. Nós temos sempre um discurso de abertura e de diálogo e cooperação, acima de tudo, sabemos que é na base da cooperação que conseguimos chegar aos nossos objetivos.

ÍRIS VAZ/CÁTIA VELOSO

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